Um camarada, durante as ditaduras militares da América Latina (num país vizinho ao Brasil), mantinha uma querela de terras. Um certo elemento, como militar, invadiu alguma área escriturada. Ele, com a complacência da Justiça, não queria desocupar o espaço alheio. A disputa, por anos, arrastava-se no Judiciário e nada de despejar o invasor. O registro do imóvel, como comprovação de direitos assegurados, parecia inócuo perante o poder da ordem instituída.
O proprietário, com a escritura em punho, procurou as instâncias maiores da República. Gastou somas expressivas com deslocamentos, impostos e taxas para resolver a disputa. O processo, nesta altura, tornou-se uma questão particular. As partes, de ambos os lados, mediam forças para angariar os direitos. O dono com a escritura em dia; o ocupante como posseiro rural. Uma questão litigiosa e de difícil conclusão.
O dono, como empresário e investidor agrícola, foi convidado para um evento do empresariado rural. O chefe maior da nação, o Presidente da República, far-se-ia presente ao evento. O Estado, com dificuldades de caixa (como sempre), precisava de empreendedores e investidores. Gente para gerar divisas e, consequentes, impostos. Oportunidades novas gerariam empregos e trariam maior fartura material.
O evento, numa determinada data, aconteceu num centro de convenções. Os participantes, inclusive o dono da querela judicial, foram enfileirados para o cumprimento da autoridade suprema. Este, como velho marechal, perpassou a classe. Ele, a cada qual, deu um cordial aperto de mão (como mandava a boa educação e a formalidade do protocolo). Uma ocasião ímpar de conhecer pessoalmente o séquito das autoridades maiores do país.
O marechal, num momento, achegou-se no cidadão. Ele, numa linguagem rápida, perguntou ao chefe: “- Posso entregar-lhe uma carta?” A resposta foi positiva! Ele, numa correspondência bem redigida, explicou o caso do processo indefinido. O ditador, dias depois, perguntou referências sobre a pessoa e do processo aos subalternos. Os oficiais de justiça cedo advieram para trazer o ultimato. A ordem de despejo seria executada caso o camarada, em tal número de horas, não abandonasse a propriedade. O cidadão, como posseiro, foi ao mundo e nada de levar vantagem na improvisação de espertezas. A ordem estabelecida, para manter a confiança nas instituições, precisava ser cumprida.
O empresário, no contexto do espanto dos amigos, falou do interesse de relatar o ocorrido ao chefe maior. Estes duvidaram de forma veemente a possibilidade (em função da “blindagem da autoridade”). Ele, de forma escrita, comunicou/falou o necessário, porém conseguiu o acesso e a atenção do militar presidente. O marechal, na hora da entrega, apanhou, de imediato, a correspondência e guardou-a no bolso interno do paletó.
A astúcia e esperteza, bem empregada e usada, mostra-se uma pérola nas extremas necessidades. Os sábios, de forma engenhosa, sempre encontram uma maneira de resolver seus dilemas. As dificuldades sempre tem uma solução e a inteligência consiste de vislumbrar a maneira mais viável de resolvê-las.
Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano da Vida”
Crédito da imagem: produto.mercadolivre.com.br
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